O Perdido e Encontrado
Peter Amsterdam
Em Lucas, capítulo 15, Jesus expressa com grande beleza o coração de Deus no que diz respeito à salvação e restauração. Ele defende Sua associação com pecadores e põe em xeque as atitudes dos que O criticavam e julgavam, contando-lhes três parábolas com narrativas similares —A Ovelha Perdida, A Moeda Perdida e O Filho Perdido. Nesta postagem tratarei das duas primeiras parábolas mencionadas.
Assim começa a história: Chegavam-se a ele todos os cobradores de impostos e pecadores para O ouvir. Mas os fariseus e os escribas murmuravam: “Este recebe pecadores, e come com eles.”[1]
Os fariseus e estudiosos da lei criticavam Jesus não apenas por comer com os pecadores, mas também por recebê-los. Reprovavam o fato de Ele comer com eles informalmente e aceitar comer na casa deles, mas talvez a maior objeção fosse que Jesus os recebia, isto é, era hospitaleiro e, possivelmente, até os recebeu para comer.
A Ovelha Perdida
Em resposta às críticas feitas pelos fariseus e escribas, Jesus defendeu e explicou Suas ações em três parábolas, a primeira das quais é uma das mais conhecidas alegorias bíblicas: “Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove e não vai após a perdida até achá-la? E quando a encontra, põe-na sobre os ombros, cheio de alegria, e vai para casa. Então convoca os amigos e vizinhos, e lhes diz: ‘Alegrai-vos comigo; achei a minha ovelha perdida.’ Digo-vos que do mesmo jeito haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento.”[2]
A defesa de Jesus começa com uma pergunta: “Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas …” Se por um lado o Antigo Testamento faz referências positivas aos pastores e apesar de Deus ser chamado Pastor de Israel na época de Jesus, os que cuidavam das ovelhas eram automaticamente classificados como “pecadores”, já que o ofício estava dentre os de pior reputação.
Os pastores com frequência eram vistos como ladrões, pois levavam os animais para pastar em terras alheias. Não eram aceitos como testemunhas nos tribunais e, em essência, ficavam no mesmo baixo patamar em que se encontravam os odiados coletores de impostos. A introdução de Jesus teve a intenção de provocar, pois pede que os líderes religiosos se imaginem pastores — e pecadores —, que não era como se viam. A pergunta de Jesus foi feita de forma a levar à dedução de que todo pastor na situação descrita buscaria a ovelha perdida.
A ovelha perdida, apesar de ser somente uma em cem, era importante para o pastor. Estava perdida, devia ser encontrada e, quando isso acontece, era motivo de júbilo para o homem. Mas a história não para aí. Então convoca os amigos e vizinhos, e lhes diz: ‘Alegrai-vos comigo; achei a minha ovelha perdida.’[3]
A comunidade da vila se alegra que o pastor que procurava a ovelha voltou em segurança e que a ovelha estava bem. A forma como foi escrito em grego para expressar que ele “convoca os amigos e vizinhos” é às vezes usada para descrever um convite para um banquete. É possível que parte da comunidade se reunisse para comer e celebrar o acontecimento. O ato de encontrar e restaurar o que estava perdido é causa de grande alegria!
Jesus termina a história com: Digo-vos que do mesmo jeito haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento.[4] Jesus faz questão de deixar bem claro que Deus muito se alegra quando alguém recebe a salvação. Dizer que há alegria no céu significa que Deus grandemente se regozija pelo pecador que se arrepende.
Em resposta às críticas com respeito às Suas interações amorosas com os pecadores, Jesus ilustra mostrando o amor de Seu Pai por todos que precisam da salvação, independentemente de quem sejam ou da classe social à qual pertençam. A atitude dos fariseus, de se queixarem da convivência que Jesus tinha com os pecadores fica caracterizada, portanto, como contrária à natureza e personalidade de Deus. Em vez de buscarem a ovelha perdida, pregavam a segregação dos pecadores perdidos.
Como muitas outras parábolas, esta é apresentada no formato “do menor para o maior”, ou seja, se o humilde pastor vai buscar e resgatar a ovelha perdida, quanto mais Deus fará o mesmo para restaurar um de Seus filhos desgarrados.
A moeda perdida
A parábola da moeda perdida é outra reflexão sobre a pergunta que Jesus fez no início da primeira parábola, só que desta vez a personagem central é uma mulher. Naquela época, na Palestina, as mulheres eram consideradas inferiores aos homens. Nessas duas histórias, Jesus começa para chocar sua audiência usando para protagonistas pessoas às quais seus ouvintes se consideravam superiores.
“Ou qual a mulher que, tendo dez dracmas, se perder uma, não acende a candeia, varre a casa e a busca com diligência até achá-la? E quando a encontra, convoca as amigas e vizinhas, dizendo: ‘Alegrai-vos comigo; achei a dracma perdida.’ Assim vos digo que há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende.”[5]
As vilas de camponeses eram quase sempre autossuficientes, produzindo seu próprio tecido e os alimentos que consumiam. Dinheiro era coisa rara, e para esta mulher, a perda da moeda era algo muito importante. A intensidade do problema é expressa quando se associa a segunda parábola com a primeira, em que, de um rebanho de cem ovelhas, uma se perdeu. No segundo caso, foi perdida uma de dez moedas.
As casas pobres na Palestina em geral tinham apenas uma porta e eram removidas algumas pedras do teto para ventilação, de forma que a luz natural no interior da habitação era pouca. É possível imaginar a ansiedade da mulher, varrendo cada cantinho, tirando os móveis do lugar e vasculhando tudo minuciosamente até encontrar o que procurava. Esta parábola destaca a diligência da busca.
Para comemorar o sucesso da busca, chama suas amigas e vizinhas para se alegrarem com ela pela moeda perdida que fora encontrada. A frase “alegrai-vos comigo” foi também usada pelo pastor para chamar os vizinhos. Como ele, a mulher quer dividir com os amigos e vizinhos a alegria de ter encontrado o que havia perdido.
Jesus então repete uma frase usada na primeira parábola: “Assim vos digo” — em outras traduções, “eu vos afirmo” — é uma frase frequente nos quatro Evangelhos, que aparece quando Jesus faz uma declaração taxativa. Nesta parábola Ele a usa para introduzir a afirmação: “Assim vos digo que há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende.”[6] Alegria diante dos anjos” ou, em outras versões, “alegria na presença dos anjos” corresponde à expressão “alegria no céu”, usada na primeira parábola para expressar o júbilo que Deus sente quando o perdido é encontrado.
A mulher procurando a moeda oferece uma analogia da diligência e esforço de Deus na busca do que está perdido. Se uma mulher que perde uma moeda vai procurá-la com todo o cuidado e ficar muito feliz quando a encontrar, quanto mais Deus buscará os que ser perderam e se regozijará quando os encontrar.
Estas parábolas ensinam como Deus vê a redenção e restauração. Diferentemente dos fariseus e dos escribas, que criticaram Jesus pelas companhias que escolhia, Deus busca salvar os que estão perdidos. Não dá importância ao status social, poder econômico, local de origem ou grau de religiosidade ou de ausência de religiosidade. Ele os busca porque estão perdidos e precisam ser encontrados. Ele os busca porque os ama, importa-se com eles e quer recuperá-los.
Pelo Seu Espírito, Deus não só Se empenha em encontrar o perdido, mas em restaurá-lo também, como visto na abnegação do pastor ao carregar a ovelha perdida de volta para o rebanho. Podemos ver essa abnegação em Jesus ao dar a vida para nos salvar e nos devolver ao Seu pai. E quando alguém é salvo e resgatado, Deus muito Se regozija!
Na Sua busca pelos perdidos, Deus muitas vezes nos usa como instrumentos de resgate. Um dos nossos trabalhos, enquanto cristãos, é compartilhar o Evangelho com os que precisam. Ficamos atentos para aqueles aos quais Ele pode estar nos guiando? E quando estamos face a face com alguém que precisa do amor e da verdade de Deus, damos os passos necessários para testemunhar para essa pessoa e transmitir a Sua mensagem?
Estamos dispostos a ser cativantes, a mostrar o amor de Deus a todos, inclusive aos menosprezados, aos desagradáveis, àqueles que hoje são desprezados e rejeitados? Estamos dispostos a nos misturarmos com os perdidos para lhes mostrar o amor incondicional de Deus e a sua salvação?
Que possamos manifestar a natureza e personalidade de Deus nas nossas interações com os que precisam do Seu amor e salvação.
Publicado originalmente em outubro 2014. Adaptado e republicado em agosto de 2020.
[1] Lucas 15:1–2.
[2] Lucas 15:4–7.
[3] Lucas 15:6.
[4] Lucas 15:7.
[5] Lucas 15:8–10.
[6] Lucas 15:10.
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