Evite a Ira (Salmo 37:8)
Tesouros
[Refraining from Anger (Psalm 37:8)]
Um poeta pouco conhecido e também compositor de hinos, escreveu:
Deixei-me levar pela raiva
E expressei esse sentimento
Magoei demais meu amigo.
E foi difícil curar o ferimento...
Uma palavra cruel que falamos,
E tantos corações são partidos.
Antes de entendermos o custo,
Muitos amigos são perdidos!
Mas uma palavra ou gentileza
Volta com muito mais valor.
Pois ela marca quem a ouve
E carrega consigo alegria e amor.
—C. A. Lufburrow
“A raiva de hoje é o remorso de amanhã”. Esse é um ditado muito verdadeiro. Sempre lamentamos profundamente e temos vontade de engolir nossas palavras quando elas resultam da impaciência e da raiva. Como Matthew Henry (1662–1714) escreveu: “Quando Caim sentiu raiva, o homicídio começou a rondar”. Quando cedemos à raiva, o autocontrole e a lógica diminuem mais do que nunca e a voz do bom senso desvanece.
Em um arroubo repentino de raiva, Moisés matou um egípcio e teve que fugir para salvar sua vida (Êxodo 2:11-15). Depois disso ele passou 40 anos no deserto cuidando paciente e humildemente de ovelhas, onde teve bastante tempo para ouvir a voz de Deus em vez de atender a seus próprios impulsos. Só depois disso estava preparado para o trabalho lento, difícil e paciente de libertar os hebreus do Egito.
A Bíblia tem muito a dizer sobre a raiva e não agirmos guiados por essa emoção. O livro de Eclesiastes diz: “Não permita que a ira domine depressa o seu espírito, pois a ira se aloja no íntimo dos tolos” (Eclesiastes 7:9). Em Colossenses somos orientados a “fazer morrer” e “abandonar a ira e a indignação” e nos revestirmos de “profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência” (Colossenses 3:5-12).
Jesus ensinou que quem se irar contra um irmão ou irmã estará sujeito a julgamento (Mateus 5:22), mas o Novo Testamento também relata que Jesus sentiu ira e justa indignação em certos casos. No capítulo 3 do evangelho segundo Marcos, lemos que ao entrar em uma sinagoga, Jesus viu um homem com uma das mãos atrofiada. Alguns dos Seus inimigos religiosos, judeus, observavam atentamente para ver se Ele quebraria suas leis e curaria esse homem no Shabat (Sábado).
Jesus disse ao homem com a mão atrofiada: “Levante-se e venha para o meio!” Então virou-Se para os religiosos e perguntou: “O que é permitido fazer no sábado: o bem ou o mal, salvar a vida ou matar?”
Eles ficaram em silêncio ao ouvirem a pergunta. “Irado, olhou para os que estavam à sua volta e, profundamente entristecido por causa dos seus corações endurecidos, disse ao homem: ‘Estenda a mão’. Ele a estendeu, e ela foi restaurada” (Marcos 3:1-5). Jesus ficou irado e triste com a hipocrisia e a dureza de coração dos que O acusavam.
A Bíblia relata que certa ocasião, Jesus manifestou Seu desagrado quando levaram crianças para Ele as tocar e abençoar, mas Seus discípulos repreendiam e tentavam afastar essas pessoas. “Quando Jesus viu isso, ficou indignado e lhes disse: ‘Deixem vir a mim as crianças, não as impeçam; pois o Reino de Deus pertence aos que são semelhantes a elas’” (Marcos 10:13,14).
O exemplo máximo da justa indignação de Jesus foi quando Se deparou com os mercadores e os cambistas que roubavam e exploravam os pobres em nome de Deus. Ele fez um chicote, entrou no templo e expulsou os cambistas; derrubou suas mesas, jogou suas moedas ao chão e os repreendeu em voz alta, dizendo: “A minha casa será chamada casa de oração; mas vocês estão fazendo dela um covil de ladrões” (Mateus 21:12,13;João 2:14-16).
A Palavra de Deus diz: “Odeiem o mal, vocês que amam o Senhor” (Salmo 97:10), e “Temer ao Senhor é odiar o mal” (Provérbios 8:13). Se realmente amamos e tememos ao Senhor, não ficaremos de braços cruzados, em silêncio ou passivos a evidentes más ações, transgressões e injustiças. A Bíblia diz que “a ira de Deus é revelada do céu contra toda impiedade e injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça” (Romanos 1:18).
Contudo, existe uma grande diferença entre a ira de Deus e a justa indignação de Jesus e o sentimento de raiva do ser humano, sobre o qual a Bíblia diz: “A ira do homem não produz a justiça de Deus” (Tiago 1:20). É triste, mas geralmente não ficamos com raiva por motivos tão nobres como os mencionados acima. Muitas vezes, essa emoção é simplesmente resultado de interesse próprio ou ocorre quando alguém nos menospreza ou trata mal – ou faz isso com alguém que nos é importante – ou então quando perdemos a paciência e ficamos frustrados, chateados e com raiva.
Quando percebemos e reconhecemos que estamos ficando irados ou chateados, é importante nos precavermos para que essas emoções não venham a se manifestar em ações ou palavras descontroladas. A Bíblia diz: “Sejam todos prontos para ouvir, tardios para falar e tardios para irar” (Tiago 1:19).
“Pronto para ouvir” significa escutar, refletir e orar pacientemente antes de reagir; fazer um esforço intencional de controlar a raiva de modo a expressar seus sentimentos de uma maneira salutar que honre a Deus. A Bíblia diz que paciência e domínio próprio são fruto do Espírito Santo (Gálatas 5:22,23) importante de ser cultivado no dia a dia e nas nossas interações. A seguinte história relatada por Billy Graham ilustra muito bem essa questão:
A muitos anos atrás, em uma região pobre de Londres, o sacerdote local estava bastante preocupado com os membros de sua paróquia que trabalhavam como estivadores. Era um serviço pesado, ingrato e mal pago. Ele decidiu que se quisesse alcançá-los com o Evangelho de Cristo, deveria se tornar um deles. Dia após dia, vestiu-se como um dos trabalhadores e ficou na fila esperando ser contratado, incógnito. Finalmente, em um dia de inverno, foi contratado para ajudar a descarregar um navio cargueiro. Seu trabalho consistia de colocar os produtos em um carrinho de mão e levar do barco para o cais, passando por uma prancha estreita. Em uma das viagens, quando a prancha balançou violentamente, ele se desequilibrou e caiu no rio gelado. Quando olhou para cima viu todos os homens rindo e percebeu que um deles balançara a prancha deliberadamente para fazê-lo cair.
Seu primeiro impulso foi reagir com raiva (ele travava uma luta contínua para controlar seu temperamento) — mas quase instantaneamente sentiu o poder do Espírito Santo substituir esse sentimento por calma. Sorriu e soltou uma boa risada. Para sua surpresa, o culpado pela brincadeira largou sua carga e foi ajudá-lo a se levantar. O “importunador” o resgatara. E qual não foi sua surpresa com a reação tão calma do colega. Começou então a conversar com o sacerdote e nisso revelou, envergonhado, que tinha sido um médico muito respeitado, mas que, devido ao alcoolismo, perdera sua família e também o direito de exercer a medicina. O sacerdote o guiou a receber Jesus. Pouco tempo depois ele voltou para sua família e a exercer sua profissão. A questão é a seguinte: isso nunca teria acontecido se o Espírito de Deus não tivesse dominado o temperamento do sacerdote e o substituído por amabilidade e pelo amor de Cristo. O Espírito Santo fez a diferença.—Billy Graham (The Journey)
A Bíblia também associa a ira à falta de sabedoria: “O tolo dá vazão à sua ira, mas o sábio domina-se” (Provérbios 29:11). E, “Quem tem entendimento controla sua raiva; quem se ira facilmente demonstra grande insensatez” (Provérbios 14:29). A melhor coisa é não verbalizar sua raiva quando está chateado, mas esperar até se acalmar. A ira causa erros, magoa aqueles que amamos e acaba com amizades. A sabedoria, por sua vez, demonstra autocontrole. “A sabedoria do homem lhe dá paciência; sua glória é ignorar as ofensas” (Provérbios 19:11).
Muitos aprenderam que uma maneira de não ceder à ira é redirecionar a energia reprimida que essa emoção incita fazendo exercícios ou uma caminhada, cuidando de plantas, lavando o carro, arrumando a cozinha, etc. Esse tipo de atividade ajuda a mudar o foco daquilo que causou a raiva e dá à pessoa tempo para se acalmar, refletir e orar sobre uma solução para o problema e em maneiras construtivas de lidar com a situação.
Algumas pessoas tentam ignorar o fato de que estão chateadas, mas a raiva reprimida e travada pode ser prejudicial à saúde. Existe comprovação clínica de que essa atitude causa mil e um tipos de problemas, desde úlceras até ansiedade e depressão. Além disso, pode levar à amargura, que tem o potencial para afetar nossa saúde espiritual e relacionamento com o Senhor. Tendo isso em conta, o apóstolo Paulo ensinou que devemos nos livrar “de toda amargura, indignação e ira, gritaria e calúnia”. Em contrapartida, devemos ser “bondosos, perdoando-nos uns aos outros, assim como Deus nos perdoou” (Efésios 4:31,32).
Portanto, se perceber que começou a sentir raiva de alguém, “não peque ao permitir que a ira o controle. Acalme a ira antes que o sol se ponha” (Efésios 4:26). Admita esse sentimento antes que fuja ao seu controle. Peça sabedoria e ajuda ao Senhor para substituí-lo por paciência, bondade, amabilidade e domínio próprio (Gálatas 5:22,23).
Memorize versículos que falam de paciência, fé, e de confiar em Deus, e sobre qual deve ser o comportamento do cristão. Em Provérbios 16:32 diz: “Melhor é o homem paciente do que o guerreiro, mais vale controlar o seu espírito do que conquistar uma cidade”. Peça a Deus para ajudá-lo, pois Ele nunca falha e prometeu ser nosso refúgio e fortaleza e um socorro bem presente na angústia ( Salmo 46:1)!
Logicamente, existem ocasiões quando é justo ficar chateado com alguém, caso a pessoa deliberadamente prejudique a nós ou a outros. Jesus disse o seguinte sobre esse tipo de situação: “Se o seu irmão pecar, repreenda-o e, se ele se arrepender, perdoe-lhe” (Lucas 17:3,4). Segundo o dicionário, “repreender” significa “admoestar energicamente; advertir, censurar”. Ainda que agir assim resulte num rompimento de relações com a pessoa, devemos perdoar, como fica evidente pela resposta de Jesus a Pedro quando este Lhe perguntou: “Senhor, quantas vezes deverei perdoar a meu irmão quando ele pecar contra mim? Até sete vezes? Jesus respondeu: Eu lhe digo: não até sete, mas até setenta vezes sete” (Mateus 18:21,22).
Enquanto seguidor de Cristo, lembre-se que o Senhor lhe perdoou, portanto você deve perdoar aos outros e “se não perdoarem uns aos outros, o Pai celestial não lhes perdoará as ofensas” (Mateus 6:14,15). “Em tudo, façam aos outros o que vocês querem que eles lhes façam; pois esta é a Lei e os Profetas” (Mateus 7:12). E a regra de ouro, “ame o seu próximo como a si mesmo” (Mateus 22:39,40). “Não devam nada a ninguém, a não ser o amor de uns pelos outros, pois aquele que ama seu próximo tem cumprido a lei” (Romanos 13:8).
Que Deus nos ajude a perdoar e a sermos amorosos e amáveis, assim como Cristo nos amou e perdoou!
De um artigo do livro Tesouros, publicado por A Família Internacional em 1987. Adaptado e republicado em julho de 2024.
Último post
- Fé e Zona de Conforto
- As Feridas de um Amigo
- O Lugar À Mesa do Pai
- A Maravilhosa Graça de Deus
- Como Abraçar e Superar a Adversidade
- Um Trabalho em Andamento
- Uma Resposta Cristã em um Mundo Polarizado
- A Viúva de Zarepta: uma História de Esperança
- Superando o Medo e a Preocupação
- A Força de Deus na Nossa Fraqueza