Cultivando a Gratidão
Peter Amsterdam
Em essência, tornar-se mais como Cristo é passar a ser um cristão melhor, ou seja, mais determinado a aplicar os ensinamentos das Escrituras pela orientação e graça do Espírito Santo. Isso tem dois efeitos. O primeiro é que exige um afastamento da impiedade, por acreditar que o que a Bíblia chama de pecado é, de fato, pecado e precisa ser resistido e superado tanto quanto possível. O segundo é que depende que nos revistamos do Cristo (Romanos 13:14), abracemos as virtudes faladas nas Escrituras, os frutos do Espírito, e vivamos de forma a reproduzi-las em nossas vidas.
Crescer em santidade é uma busca perpétua. É preciso intencionalidade para mudar; dedicação e a disposição para manter o esforço regular para positivamente mudar nossas ações, pensamentos, desejos e perspectivas. É uma transformação espiritual, uma renovação da mente que implica em se tornar uma nova criatura. Devemos tomar a decisão de que, “quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem... e vos renoveis no espírito do vosso entendimento; e vos revistais do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade” (Efésios 4:22–24).
Em seu livro Cultivating Christian Character, (Cultivando o Caráter Cristão, em tradução livre) por Michael Zigarelli, o autor conduziu uma pesquisa que envolveu cinco mil cristãos e encontrou indicadores de que virtudes parecem contribuir para o crescimento e desenvolvimento do caráter cristão, dentre as quais três se destacam: gratidão, alegria de viver e uma vida centrada em Deus.[1]
Essa combinação de alegria, uma vida centrada em Deus e gratidão pode ser vista no conselho de Paulo, quando escreveu: “Regozijai-vos sempre; orai sem cessar; em tudo dai graças, pois esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco” (1 Tessalonicenses 5:16–18).
A gratidão se expressa nas Escrituras como ações de graças. Baseia-se no conceito de que em todo lugar e em toda situação, o povo de Deus deve continuamente dar graças a Deus, que nos criou e remiu. No Antigo Testamento, a palavra hebraica mais comumente usada nesse sentido é todah, que significa graças, gratidão e ações de graças. Assim é como se diz “obrigado” no hebraico moderno. A palavra todah é abundante no Livro dos Salmos, onde se encontram muitas passagens de louvor e ações de graças a Deus.[2]
No Novo Testamento também é grande o número de expressões de gratidão a Deus e de instruções para assim proceder. Lemos o exemplo de Jesus dando graças e de crentes dando graças a Cristo (Mateus 11:25, 26:27; João 11:41). Na verdade, é-nos disto para darmos graças a Deus por tudo e sempre (Efésios 5:20). A gratidão deve ser uma maneira de viver. Devemos também expressar nossa gratidão aos outros e, principalmente a Deus, que nos dá a vida.
Cultivar a gratidão muda nossa perspectiva de vida e, com o tempo, produz um novo contexto ou nos dá um filtro para percebermos as circunstâncias. Passamos a ver nossas experiências e tudo que temos à luz do amor de Deus, e isso produz gratidão. Mudar a nossa perspectiva, pois reconhecemos que, independentemente da situação, ela poderia ser pior, mas não é. Não significa que não devamos fazer o necessário para melhorar nossa condição, mas sim estarmos agradecidos pelo que temos, pela vida, por termos o suficiente — mesmo que não tenhamos abundância ou tanto quanto os outros.
De certa maneira, gratidão é uma mentalidade, uma maneira de encarar a vida em que, independentemente das circunstâncias, escolhemos enxergar pelas lentes da gratidão a Deus pelo Seu amor, desvelo e provisão. Em vez de nos compararmos com os outros ou nos queixarmos da vida, agradecemos a Deus pelo que temos. Para isso, é preciso uma nova maneira de pensar. Devemos focar as bênçãos que temos, em vez daquilo que nos falta ou de como a vida seria melhor “se ao menos…”. A gratidão nos deixa satisfeitos com a nossa circunstância e nos faz regularmente agradecer ao Senhor pelas nossas bênçãos, sejam poucas ou muitas.
Para cultivar a gratidão, devemos nos condicionar a repelir pensamentos que nos deixem insatisfeitos com nossas circunstâncias. Quanto mais nos compararmos com os outros e desejarmos o que eles têm, menos satisfeitos estaremos com a nossa situação, o que nos impedirá de ver o amor de Deus e a maneira como Ele cuida de nós. Seremos incapazes de valorizar o que Ele fez e continua fazendo em nossas vidas. Se não nos livrarmos de pensamentos negativos e invejosos, ficaremos presos à mentalidade que nos rouba a alegria e felicidade que vem da consciência da presença e bênçãos de Deus.
Em sua pesquisa, Zigarelli descobriu que os cristãos que se destacam pela gratidão foram os que aprenderam a estar contentes, que raramente desejam o que os outros têm. Ao longo do dia, se lembram de como Deus os abençoa. É interessante notar que os que na pesquisa se identificaram como os mais gratos se encontram em patamares econômicos mais baixos, o que sugere que sua gratidão não depende de seus bens materiais ou do automóvel que possuem, mas de um coração agradecido.
A base para cultivar a gratidão de ser confiar no amor infalível de Deus por nós. É muitas vezes difícil nos sentirmos gratos diante de adversidades, quando a vida parece não fazer sentido ou quando nossas orações não produzem efeitos visíveis. Contudo, ser grato não depende de nossas circunstâncias, mas da fé de que Deus nos ama e que ouve as nossas orações; de acreditarmos que, ainda que as circunstâncias não mudem, sempre teremos pelo que agradecer, inclusive nas piores situações.
Uma maneira de cultivar a gratidão é manter um registro das coisas pelas quais estamos gratos. Um diário só de gratidão ajuda a fazermos um balanço das bênçãos e focarmos nelas. Cada um de nós tem numerosas coisas pelas quais podemos agradecer cada dia, entretanto, raramente paramos para reconhecer esse fato. E como não fazemos isso, não ocorre um registro das bênçãos e de tudo pelo que devemos estar agradecidos.
Existem muitas coisas em nossas vidas, grandes e pequenas, que podemos identificar como bênçãos de Deus: nossos dons e talentos; metas alcançadas; oportunidades que surgiram; nossa saúde e muito mais. Algumas são coisas do dia a dia, como comida na mesa, água na torneira e um vaso sanitário. Há também nossa família e amigos que nos amam, assim como pessoas que nos ajudaram ou que, de alguma forma, se importaram conosco. Existem inúmeras coisas pelas quais devemos estar gratos, mas que muitas vezes não reconhecemos. Ter um diário nos ajuda nesse sentido, pois ao registrarmos nossas bênçãos, começamos a educar nossas mentes para reconhecê-las. Aos poucos, mudamos o nosso modo de pensar e a gratidão se torna parte de nós e nos coloca no caminho para uma maior semelhança de Cristo.
Existe também uma ligação entre confessar um pecado e sentir mais gratidão. Quando temos o hábito de levar nossos pecados diante de Deus, lembramo-nos de nossas falhas e de Sua misericórdia. Saber que somos perdoados e que Ele nos concede a dádiva da misericórdia produz um sentimento de gratidão. Confessar pecados ao Senhor é parte do processo de nos deixarmos a velha criatura e nos revestirmos “do novo, que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Colossenses 3:9–10).
Lembrar-se dos pobres em nossas orações pode também aumentar nossa gratidão. Quando intercedemos por aqueles que têm menos que nós, lembramos de como a vida é difícil para alguns e ficamos mais gratos pela que temos. Quando oramos pelos refugiados, que deixaram tudo para trás e arriscaram a vida para chegar a algum lugar seguro, isso nos ajuda a manter nossa situação em perspectiva. Zigarelli escreveu:
Nossa referência se torna a viúva carente, a criança faminta, o pai desempregado, o bebê doente, o refugiado forçado a sair de seu país em guerra, o “próximo” no Terceiro Mundo que não tem eletricidade ou água encanada. Orar diariamente por essas pessoas é uma prática que ilumina nossa existência com a luz flamejante da providência de Deus e, como resultado, as situações podem se reverter. A inveja dá lugar à satisfação; o ressentimento dá lugar ao contentamento; as queixas, ao louvor. A gratidão que catalisa essas mudanças nasce de uma perspectiva mais clara que se obtém quando pensamos nos menos favorecidos.[3]
Nós, cristãos, possuímos a bênção maior, a salvação, o conhecimento de que viveremos com Deus para sempre. Relacionamo-nos com o Criador que mantém todas as coisas. Nosso Deus é também nosso Pai, que sabe do que precisamos e promete cuidar de nós. Não importam as circunstâncias, estamos na Sua presença. Nossa vida deve ser de gratidão, de ações de graças a Deus. “Dando graças constantemente a Deus Pai por todas as coisas, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo” (Efésios 5:20).
Publicado originalmente em janeiro de 2017. Adaptado e republicado em agosto de 2023.
[1] Michael Zigarelli, Cultivating Christian Character (Colorado Springs: Purposeful Design Publications, 2005).
[2] E. E. Carpenter and P. W. Comfort, in Holman Treasury of Key Bible Words: 200 Greek and 200 Hebrew Words Defined and Explained (Nashville: Broadman & Holman, 2000), 188.
[3] Zigarelli, Cultivating Christian Character, 36.
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