Março 29, 2022
Geralmente, tramas nas quais os personagens principais são felizes, bem-sucedidos e vivem uma vida tranquila não parecem ser as mais interessantes nem se tornam bestsellers. Se a vida do protagonista já é perfeita, então para que serve a história? Os livros que despertam o interesse são, pelo contrário, os que começam com “o homem é acusado falsamente de um crime, passa anos preso, antes de escapar com a intenção de confrontar seus acusadores e limpar seu nome”. Essas são as histórias com maior probabilidade de despertar o interesse do leitor. Queremos saber o que vai acontecer, se as coisas vão dar certo. As dificuldades e obstáculos enfrentados pelos personagens nos levam a desejar coisas para suas vidas.
Na vida real, entretanto, a maioria de nós não tem muita queda para focar nos pontos baixos da própria vida. Preferimos evitar os reveses e desejamos avançar direto para as partes boas e para a cena do “viveram felizes para sempre”, em que a pessoa se ergue triunfante sobre os obstáculos da vida e segue rumo ao pôr do sol ao som de uma orquestra. Mas, na realidade, são os altos e baixos vividos pelo protagonista anteriormente antes da cena final, que dão sentido à trama de um livro ou filme. Caso contrário, os filmes teriam dez minutos de duração em vez de uma hora e meia em média.
Diretores e autores criam cenas do tipo “aguenta coração”, para produzir certos efeitos, mas, na vida real, estou para encontrar alguém que não tenha passado por reveses. Períodos difíceis na vida surgem nos mais diversos tamanhos e formatos. Podem se manifestar como depressão por conta de situações ou circunstâncias para as quais parece não haver esperança, impaciência com uma situação ou com pessoas que não atendem às expectativas, ou quando acontece uma tragédia e então os bons momentos da vida parecem memórias distantes ou duvidosas esperanças futuras.
O Salmo 139:16 diz: “Todos os dias que foram ordenados para mim, no teu livro [de Deus] foram escritos quando nenhum deles havia ainda.” E, visto que todos passam por dificuldades na vida, deve haver benefícios para nossos espíritos nesses momentos difíceis, ordenados por Deus, os quais aumentarão o valor da cena final de nossas vidas.
Nelson Mandela passou 27 anos preso antes de assumir a liderança da África do sul, em um momento crucial da história daquele país. Aqueles 27 anos sem dúvida foram o pior período da sua vida. No entanto, durante os 27 anos que passou encarcerado, ele nunca perdeu a esperança em seu país nem na sua causa. Aprendeu, estudou e, chegado o seu momento, estava pronto. Aqueles 27 anos na prisão foram importantes e é bem provável que o tempo como prisioneiro tenha contribuído para o transformar na pessoa que precisava ser para liderar seu país.
Os reveses da vida podem ser marcos na nossa vida, pois nos fazem refletir no nosso propósito e no que realmente conta. O mais importante é que podem nos fazer pensar no que Deus quer para nós e de nós. E, se estivermos receptivos, essas experiências têm o potencial para nos dar insight, orientação, sabedoria e nos ensinar lições valiosas.
Resumindo: Os momentos “baixos” da vida nos ensinam lições que não aprendemos com os “altos”. Constroem caráter e nos lembrar o que realmente conta na vida. Eu provavelmente jamais chegarei ao ponto de curtir os reveses na minha vida, mas acho que encontrar sentido para esses momentos me ajuda a aceitar o fato de que, muitas vezes, é o caminho que Deus escolhe para me levar a outro patamar e maior crescimento espiritual.
O seguinte Salmo me consola nas dificuldades: “Esperei com paciência pelo Senhor; ele se inclinou para mim, e ouviu o meu clamor. tirou-me de um lago horrível, de um charco de lodo; pôs os meus pés sobre uma rocha, firmou os meus passos. Pôs um novo cântico na minha boca, um hino de louvor ao nosso Deus.”[1]
A vida é maior que os reveses, e durante os períodos difíceis, Deus pode nos dar uma nova canção para cantarmos.—T.M.[2]
Eram seis e meia da manhã. Eu tinha acordado cedo e a primeira cena com a qual me deparei foi uma chuva torrencial no dia que planejáramos fazer um passeio em família. A chuva não me incomoda. Com certeza a terra estava precisando. Da janela, vi um pardalzinho pulando de um lado para o outro, atento à terra empapada, na esperança de encontrar alguma minhoca quase afogada com a qual se banquetear.
Naquele momento, me senti como a coitada da minhoca. Fazia meses que nuvens escuras aos poucos cobriram os céus da nossa pequena família. Nosso filho pequeno não estava crescendo no ritmo previsto e esse atraso o deixava chateado e explosivo, afetando sua felicidade dia-a-dia e, às vezes, “hora-a-hora”. Não era raro ele acordar chorando, à noite. Normalmente ele era um menino dócil, sensível, carinhoso e cheio de alegria. Mas precisávamos entender melhor suas dificuldades para atendermos suas necessidades de crescimento, e isso era para já, enquanto ainda era jovem e maleável, antes que os efeitos secundários e, às vezes, mais trágicos da baixa autoestima e depressão invadissem aquela vida em tão tenra idade.
E como se não bastasse, fazia quatro dias que meu marido e eu ficáramos sabendo que seu emprego estava com os dias contados, o que significava procurarmos um novo trabalho e também outra casa. No passado, seria para mim uma oportunidade de me lançar nos braços do futuro desconhecido, percorrer o mundo perseguindo meu destino aonde a brisa me levasse. Mas agora eu estava no limiar de uma mudança maior em um momento crucial na vida do meu filho.
Quatro dias pareciam quatro anos, e a cada hora eu me agarrava a fios de esperança na forma de um versículo bíblico ou de alguma citação inspiradora, como se fossem cordas salva-vidas em uma enchente. Muitos homens e mulheres de fé ao longo das eras enfrentaram períodos difíceis e aflições, sobre os quais escreveram contos, poemas e hinos. Eu me agarrava aos seus pensamentos. Às vezes, repetia uma frase indefinidamente, como um mantra, simplesmente para manter a presença de espírito, enquanto cuidava dos filhos e dos afazeres domésticos. E funcionava.
Parada ali, olhando para aquele passarinho, ouvi a consoladora voz do meu Salvador, com a qual estava tão habituada: “Você não é a minhoca, minha querida. Você é o pássaro. As chuvas e as tempestades que permiti caíssem sobre o seu mundo lhe oferecem um banquete que, sob outras circunstâncias, você teria de escavar para encontrar.” E naquele instante, minha perspectiva mudou. Naquela hora aparentemente triste e sombria, Jesus preparava diante mim uma mesa e me oferecia um banquete. Delícias que teríamos de escavar para encontrar em circunstâncias normais, vinham para a superfície —dádivas especiais como estarmos mais próximos de Jesus e uns dos outros, mais amor e gratidão pelos nossos amigos e parentes, além de um desejo ardente de, por meio da oração, confiar a Jesus nossas necessidades e temores diários.
E a chuva? Ainda não havia parado. Algumas de nossas orações haviam sido atendidas maravilhosamente (mudamos para outra casa e meu marido encontrara outro emprego) e isso nos animava, mas ainda tínhamos grandes desafios em outras frentes. Mas ali estávamos como passarinhos felizes e saltitantes, apesar da chuva, porque, por mais estranho que pareça, banqueteávamos em minhocas!—Megan Dale
A Bíblia ensina que Deus está próximo dos que têm o coração quebrantado[3] e Ele é um socorro bem presente na angústia.[4] Ele é mais que um ombro ou mão amiga. Ele vai ao recôndito do coração, aliviando a dor e o sofrimento, e os substituindo com Seu amor, paz, consolo, e até alegria — independentemente das suas circunstâncias. Ele cria um arco-íris ao incidir a Sua luz sobre as lágrimas. — É o sol após a chuva e a luz. Nos momentos de maior provação, a Sua Palavra escrita ou a Palavra viva, que Ele fala diretamente à sua mente vai ganhar sentido para você, se apenas estender a mão para recebê-la.—Rafael Holding
Publicado no Âncora em março de 2022.
[1] Salmo 40:1–3 NVI.
[2] Este artigo foi adaptado de um podcast de Just1Thing, um site cristão para jovens de edificação de caráter.
[3] Salmo 34:18.
[4] Salmo 46:1.
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