O Reino de Deus: Presente e Futuro

Julho 12, 2021

Peter Amsterdam

[The Kingdom of God: Present and Future]

O tema central dos ensinamentos de Jesus encontrado nos Evangelhos foi o “reino de Deus” em três menções importantes: na oração do Pai Nosso, no Sermão da Montanha, e na Última Ceia e em várias outras parábolas. Apesar de a frase “reino de Deus” não ser encontrada no Antigo Testamento, o conceito do Reino de Deus e Sua soberania encontra-se em muitos versículos do Antigo Testamento, tais como: “O Teu trono, ó Deus, é eterno e perpétuo; o cetro do Teu reino é um cetro de equidade. Pois o reino é do Senhor, e Ele domina entre as nações.[1]

Ao longo dos séculos, o povo judeu entendeu Deus como rei, tanto no sentido universal de governante da Terra, quanto, especificamente, o rei daquela nação, que se entendia ser Seu povo.[2] Deus chamou a antiga nação de Israel de uma forma especial para viver sob Seu governo e reconhecer Sua soberania — Seu reino e Seus mandamentos. Infelizmente, de uma maneira geral, Israel não viveu em conformidade com o que Deus definiu em Seus mandamentos, razão pela qual os profetas por Ele enviados falam da necessidade de uma renovação:

“Dar-vos-ei um coração novo, e porei dentro em vós um espírito novo... Porei dentro em vós o meu Espírito, e farei que andeis nos Meus estatutos, e guardeis os Meus juízos, e os observeis.[3]

As Escrituras falavam da vinda de alguém que se sentaria no trono de Davi — uma profecia que, entendia-se, dizia respeito ao Messias:

“Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu; o principado está sobre os Seus ombros, e o Seu nome será: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz. Do aumento do Seu governo e paz não haverá fim. Reinará sobre o trono de Davi e sobre o seu reino, para o estabelecer e o fortificar em retidão e justiça, desde agora e para sempre.[4]

Nos dias de Jesus, havia grande expectativa quanto a vinda desse Messias. O entendimento geral com respeito a Ele estava conectado à esperança de libertação e salvação da ocupação estrangeira sob a qual os judeus viviam desde seu retorno do tempo de exílio na Babilônia. Por séculos foram governados pelos gregos, ptolemaicos e selêucidas. Então, após 100 anos de autonomia, passaram a ser dominados por Roma. Ansiavam por não mais serem governados por estrangeiros. A expectativa era que o Messias prometido os livrasse do domínio estrangeiro e refundasse o reino de Israel, o qual consideravam ser o reino de Deus.

Por esse motivo, o povo ficou entusiasmado ao saber de um homem que realizava milagres e falava do reino de Deus. Talvez tivesse chegado a hora da libertação da nação de Israel de um governo estrangeiro e a instituição do reino físico que eles esperavam. Contudo, o ensinamento de Jesus foi além da questão política ou geográfica, pois Ele redefiniu e substituiu as expectativas do povo judeu em relação ao reino.

Um reino presente ou futuro?

Quando Jesus falou do reino, em certas ocasiões disse que ele havia chegado e em outras que viria no fim da era/mundo. Um autor explica que o período no qual transcorreu o Antigo Testamento foi a preparação para o reino de Deus; o ministério, a morte e a ressurreição de Jesus estabeleceram o reino; e o julgamento final será sua conclusão.[5]

A seguir, encontram-se versículos que falam da introdução do reino de Deus a este mundo por meio de Jesus e do Seu ministério.

Certa vez, tendo sido interrogado pelos fariseus sobre quando viria o Reino de Deus, Jesus respondeu: “O Reino de Deus não vem de modo visível, nem se dirá: ‘Aqui está ele’, ou ‘Lá está’; porque o Reino de Deus está entre vocês”.[6]

Jesus salienta que além de não ser físico, o reino de Deus estava entre eles. Mesmo ao falarem que o reino está presente, os versículos seguintes se referem ao futuro:

“Nem todo o que me diz: ‘Senhor, Senhor!’ entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus.[7]

“Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: ‘Vinde, benditos de Meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo.’”[8]

Outras passagens e parábolas se referem ao reino como algo do futuro.[9] De forma que o reino é algo que estava presente nos dias de Jesus (e continua presente desde então), ou é um reino futuro que chegará quando houver o juízo?

Quando o reino é visto como o dinâmico reino de Deus, pode ser entendido tanto como uma realidade presente que iniciou pelo ministério de Jesus quanto uma manifestação futura de algo perfeito e completo.

Entrar no Reino de Deus

Os milagres de Jesus eram indicadores de que o reino de Deus viera e estava presente, pelo menos parcialmente, durante Seu ministério. Jesus também ensinou o significado do reino de Deus por meio de Suas ações e palavras. Quando João Batista enviou seus discípulos para perguntar a Jesus se Ele era Aquele que esperavam, ou se deveriam procurar outro, Jesus respondeu dizendo: “Ide, e anunciai a João o que tendes visto e ouvido: os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados e aos pobres é anunciado o Evangelho.”[10]

Jesus estava revelando informações sobre o reino por meio de Seus ensinamentos. Contou muitas parábolas que ilustravam o reino do céu ou fazendo comparações: o reino do céu é como um grão de mostarda; um homem que jogou a boa semente no campo; fermento; tesouro escondido em um campo; uma rede que é lançada ao mar; um rei que ofereceu um banquete de casamento ao seu filho.[11]

Ao comer com os que viviam à margem do judaísmo — os coletores de impostos e pecadores —, tocar os impuros, perdoar pecados e curar no Sabá, Jesus ofereceu um entendimento mais profundo da graça, do amor, do desvelo e da misericórdia do Pai, assim como da natureza do Seu reino.

Ao ensinar os discípulos a orarem ao “Pai nosso, no céu”, conduziu-os a um novo relacionamento com Deus, tornando-os parte da Sua família.[12] Entrar no reino de Deus significa estabelecer uma nova relação com Deus. Quando alguém se decide pelo reino, torna-se parte dele. Vemos a necessidade desse tipo de compromisso no chamado dos Evangelhos ao arrependimento: “O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede no Evangelho”.[13]

A mulher que lavou os pés de Jesus com suas lágrimas e os secou com os cabelos estava revestida de uma nova atitude de amor e gratidão para com Deus porque seus pecados haviam sido perdoados.[14]

Quando Deus reina em nossas vidas, nossa atitude de confiança e fé reflete o que é expresso na oração que Jesus ensinou aos Seus discípulos: “Seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu.”[15] Aos que depositam em Deus sua confiança e passam a se relacionar com Ele por intermédio do sacrifício do Seu Filho, o reino de Deus se torna uma realidade presente.

Quando alguém entra no reino, o centro de sua vida muda. Essa pessoa é regenerada, nascida do Espírito. Entrega-se ao reino de Deus e nEle coloca sua confiança. Como visto nos ensinamentos de Jesus no Sermão da Montanha e em outras passagens, espera-se que o convertido cultive um conjunto de valores elevados: perdoar os outros, amar os inimigos e mais.

Apesar de os ensinamentos de Jesus sobre o reino ter semelhanças com o que em geral era ensinado no judaísmo, Ele não apenas se excedeu aos conceitos tradicionais, mas redefiniu sua interpretação. Demonstrou pela Sua vida, morte e ressurreição, que o reino de Deus não era uma esperança ambígua com relação ao futuro. Pela vinda de Jesus, o reino se tornou iminente e exigia uma reação imediata.

Além disso, Jesus ensinou que o acesso ao reino não era concedido apenas aos que pertenciam ao povo judeu, mas a qualquer um que pudesse entrar. O centro da questão não era a nação física de Israel, mas se estendia a todos que escolhessem se tornar parte do povo de Deus, ao escolherem renovarem seus corações e nascerem de novo. Jesus deixou claro que não apenas judeus podiam entrar no reino, na conversa que teve com a samaritana ao lado do poço, quando lhe disse: “Vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade, pois o Pai procura a tais que assim o adorem”.[16]

A plenitude do reino existirá quando Jesus voltar para estabelecer Seu reino na Terra. “Os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do seu Cristo, e Ele reinará para todo o sempre.”[17]

Vivendo no Reino

Entrar no reino pela crença em Jesus nos concede a vida eterna, que não é algo que só começa depois da morte. Como o reino de Deus, a vida eterna é uma realidade presente e, para nós, que cremos, já começou. Nosso corpo físico acabará na morte, mas nosso espírito continuará a viver eternamente com Deus. Nosso espírito, nossa essência, a pessoa que somos hoje, simplesmente vai passar pela porta de saída de nossa vida terrena — a morte — e entrar na continuação eterna de nossas vidas.

É importante entender que se espera que vivamos o reino de Deus no presente. Como? Abrindo mão daquilo que pode ser entendido como nosso próprio “reino”. A cada um foi dada por Deus uma medida de autonomia e autoridade de Deus, na forma de livre arbítrio. Assim sendo, temos, de certa forma, um “reino” no qual podemos fazer escolhas discricionárias. É parte do sermos feitos à imagem de Deus.

Quando entramos no reino de Deus, somos chamados para integrar nosso “reino” — aquilo sobre o que reinamos — ao Seu reino. Devemos alinhar nossa vontade com Deus e deixar Sua vontade guiar nossas vidas, incluindo nossos pensamentos e ações externas.

Viver no Reino de Deus tem a ver com a vida do dia a dia, uma vida que deriva de uma relação pessoal, interativa com Ele, um relacionamento que abrange nossa vida terrena e que continua por toda a eternidade.

Publicado originalmente em julho de 2015. Adaptado e republicado em julho de 2021.


[1] Salmo 45:6; Salmo 22:28.

[2] Salmo 103:19.

[3] Ezequiel 36:26–27.

[4] Isaías 9:6–7.

[5] J. Rodman Williams, Renewal Theology: Systematic Theology from a Charismatic Perspective (Grand Rapids: Zondervan, 1996), 290.

[6] Lucas 17:20–21. Ver também Lucas 16:16.

[7] Mateus 7:21.

[8] Mateus 25:34.

[9] Mateus 8:11–12; 5:18–20; 13:24–30, 47–50.

[10] Lucas 7:22.

[11] Mateus 13:31, 24, 33, 44, 47; 22:2.

[12] Mateus 6:9.

[13] Marcos 1:15.

[14] Lucas 7:36–50.

[15] Mateus 6:10.

[16] João 4:23.

[17] Apocalipse 11:15.

 

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